O que foi a Guerra do Ópio?
por Roberto Navarro
Na verdade, não foi uma guerra, mas duas - ambas travadas no século 19 na China. Nesses conflitos, Grã-Bretanha e França se aliaram para obrigar a China a permitir em seu território a venda de ópio, uma droga anestésica extraída da papoula (veja como funciona o processo no infográfico abaixo). Para britânicos e franceses, exportar ópio para a China era uma forma de compensar o prejuízo nas relações comerciais com os chineses, que vendiam aos ocidentais mercadorias muito mais valorizadas, como chá, porcelanas e sedas. Mas o governo de Pequim não via o troca-troca com bons olhos: a partir do século 18, o consumo da droga explodiu no país, causando graves problemas sociais - nem um decreto imperial de 1796 conseguiu deter a expansão do problema. A coisa pegou fogo de vez em 1839, quando o governo chinês destruiu uma quantidade de ópio que estava na mão de mercadores britânicos equivalente ao consumo de um ano. O governo da Grã-Bretanha reagiu enviando ao Oriente navios de guerra e soldados, dando origem à primeira Guerra do Ópio. Mais bem equipada, a tropa britânica venceu os chineses em 1842, obrigando-os a assinar um tratado de abertura dos portos e de indenização pelo ópio destruído - mas o comércio da droga continuava proibido. O negócio complicou de novo em 1856, quando autoridades chinesas revistaram um barco britânico à procura de ópio contrabandeado. Era a desculpa que a Grã-Bretanha precisava para declarar a Segunda Guerra do Ópio, vencida novamente pelos ocidentais em 1857. Como preço pela derrota, a China teve de engolir a legalização da importação de ópio para o país por muito tempo: o uso e o comércio da droga em território chinês só foram banidos de vez após a tomada do poder pelos comunistas, em 1949.
O sedutor Triângulo do Ouro
Patrizia Bergamaschi
As belas e coloridas imagens das populações tribais dessa região isolada sugerem riqueza folclórica e uma cultura muito particular. Contudo, sobre essas etnias pesa a fama internacional de "povo do ópio"
Provenientes de várias etnias, as populações tribais que vivem no famoso Triângulo do Ouro, área de verdes colinas que marca as fronteiras entre Tailândia, Mianmá e Laos, caracterizam-se pela diversidade lingüística, pela curiosa distinção das roupas das mulheres, pela ausência de escrita e do registro histórico. Vivendo basicamente da agricultura (as populações tribais não conhecem a propriedade da terra que está disponível para todos), desenvolvem uma economia de mercado baseada na troca de mercadorias de igual valor.
A vida social é aberta, partilhada e não há uma autoridade política constituída. Quando, por exemplo, uma família dá uma festa ou por ocasião de um enterro, rito de iniciação ou quando alguém está doente, o chefe da família mata um animal e divide a carne com os habitantes da aldeia, num gesto de pertença comunitária do qual tem certeza que receberá restituição, visto que o não intercâmbio coloca em jogo o prestígio da família.
Um isolamento favorável
Essa região, considerada uma das mais inacessíveis do mundo, inclusive pelas condições climáticas, usufrui de seu isolamento. Longe dos olhos do mundo - e das autoridades -, mas na mira de um fiel mercado consumidor, o Triângulo do Ouro concentra uma significativa parte da produção mundial de ópio e heroína.
Se seu "mágico" produto interessa muito ao mundo moderno, seu cultivo e sistema de distribuição não necessitam dos conhecimentos e das facilidades que a tecnologia oferece. Pelo contrário, uma conseqüência da produção do ópio é o esaurimento do solo até sua completa infertilidade. Em janeiro, fazem o desmatamento da floresta; entre novembro e dezembro, colhe-se o arroz e entre fevereiro e março do ano seguinte, a papoula do ópio. A cultura é relativamente fácil, os instrumentos agrícolas podem ser comprados no local, mas é necessária muita mão-de-obra, geralmente suprida pelas famílias ou, numa alternativa comum, por viciados, dispostos a trabalhar na condição de marginalizados e em troca de um pouco de droga.
Economia clandestina, mas rentável
A economia do ópio atinge cifras consideráveis de fazer inveja a muitos países. Noventa por cento da produção mundial de 1996, por exemplo, foram provenientes de apenas 6 países - Irã, Paquistão, Afeganistão, Mianmá, Laos e Tailândia - e somaram 5 mil toneladas!
Colhida a delicada flor, que cresce melhor em terrenos localizados entre 1000 e 1600 metros de altitude, procede-se a duas operações: a incisão das cápsulas das papoulas e a raspagem do látex coagulado. Com uma faca com duas ou três lâminas ligeiramente curvas e de igual comprimento (cerca de 10 cm) e amarradas por uma corda de algodão, corta-se a cápsula da flor; dessas incisões sai uma linfa esbranquiçada que, entrando em contato com o ar, rapidamente coagula, tornando-se marrom escura. É esse látex que, no dia seguinte, raspado com uma faca de metal, constitui o ópio em seu estado bruto.
Para ser transportada, a droga é envolvida em pétalas de papoula ou em papel de seda: seu peso é levíssimo, pode ser bem conservada por vários anos e nenhum outro produto agrícola custa tanto por tão pouco peso.
Da produção anual de uma família - 5 a 8 quilos -, uma pequena parte pode ser para seu próprio uso, empregada para aliviar o cansaço, combater a dor, inclusive no caso de malária. A dependência da droga não traz complicações legais, mas cabe às mulheres, sobretudo as mais jovens, a maior oposição, visto que não querem se casar com dependentes de um vício que prejudica não só a saúde, mas também a imagem diante da comunidade tribal.
As capitais asiáticas da droga
TAILÂNDIA: único país do Triângulo do Ouro que conseguiu reduzir consideravelmente a produção de ópio, baixando de uma média anual de 450 toneladas, na primeira metade dos anos 70, para 40 toneladas em 1990. Logo após a proibição do uso de ópio na Tailândia, em 1959, houve uma rápida difusão do consumo de heroína. A maior parte dos usuários, que são cerca de 500 mil, dos quais 300 mil residentes na área de Bangcoc, tem menos de 30 anos.
MIANMÁ: maior produtor mundial de ópio ilegal e exportador de heroína. Ainda que seja difícil precisar as cifras reais, fala-se numa produção anual de 2300 toneladas, o que corresponde a 60% do total mundial. A maior parte da colheita de ópio é controlada por grupos das minorias étnicas.
LAOS: terceiro produtor mundial de ópio, depois de Mianmá e da Índia. O aumento do cultivo de ópio nesse país deve-se ao sucesso do programa de extirpação e substituição de suas plantações na Tailândia. Em 1990, a produção foi de 300 toneladas.
http://www.youtube.com/watch?v=SuxXwG6747I
por Roberto Navarro
Na verdade, não foi uma guerra, mas duas - ambas travadas no século 19 na China. Nesses conflitos, Grã-Bretanha e França se aliaram para obrigar a China a permitir em seu território a venda de ópio, uma droga anestésica extraída da papoula (veja como funciona o processo no infográfico abaixo). Para britânicos e franceses, exportar ópio para a China era uma forma de compensar o prejuízo nas relações comerciais com os chineses, que vendiam aos ocidentais mercadorias muito mais valorizadas, como chá, porcelanas e sedas. Mas o governo de Pequim não via o troca-troca com bons olhos: a partir do século 18, o consumo da droga explodiu no país, causando graves problemas sociais - nem um decreto imperial de 1796 conseguiu deter a expansão do problema. A coisa pegou fogo de vez em 1839, quando o governo chinês destruiu uma quantidade de ópio que estava na mão de mercadores britânicos equivalente ao consumo de um ano. O governo da Grã-Bretanha reagiu enviando ao Oriente navios de guerra e soldados, dando origem à primeira Guerra do Ópio. Mais bem equipada, a tropa britânica venceu os chineses em 1842, obrigando-os a assinar um tratado de abertura dos portos e de indenização pelo ópio destruído - mas o comércio da droga continuava proibido. O negócio complicou de novo em 1856, quando autoridades chinesas revistaram um barco britânico à procura de ópio contrabandeado. Era a desculpa que a Grã-Bretanha precisava para declarar a Segunda Guerra do Ópio, vencida novamente pelos ocidentais em 1857. Como preço pela derrota, a China teve de engolir a legalização da importação de ópio para o país por muito tempo: o uso e o comércio da droga em território chinês só foram banidos de vez após a tomada do poder pelos comunistas, em 1949.
O sedutor Triângulo do Ouro
Patrizia Bergamaschi
As belas e coloridas imagens das populações tribais dessa região isolada sugerem riqueza folclórica e uma cultura muito particular. Contudo, sobre essas etnias pesa a fama internacional de "povo do ópio"
Provenientes de várias etnias, as populações tribais que vivem no famoso Triângulo do Ouro, área de verdes colinas que marca as fronteiras entre Tailândia, Mianmá e Laos, caracterizam-se pela diversidade lingüística, pela curiosa distinção das roupas das mulheres, pela ausência de escrita e do registro histórico. Vivendo basicamente da agricultura (as populações tribais não conhecem a propriedade da terra que está disponível para todos), desenvolvem uma economia de mercado baseada na troca de mercadorias de igual valor.
A vida social é aberta, partilhada e não há uma autoridade política constituída. Quando, por exemplo, uma família dá uma festa ou por ocasião de um enterro, rito de iniciação ou quando alguém está doente, o chefe da família mata um animal e divide a carne com os habitantes da aldeia, num gesto de pertença comunitária do qual tem certeza que receberá restituição, visto que o não intercâmbio coloca em jogo o prestígio da família.
Um isolamento favorável
Essa região, considerada uma das mais inacessíveis do mundo, inclusive pelas condições climáticas, usufrui de seu isolamento. Longe dos olhos do mundo - e das autoridades -, mas na mira de um fiel mercado consumidor, o Triângulo do Ouro concentra uma significativa parte da produção mundial de ópio e heroína.
Se seu "mágico" produto interessa muito ao mundo moderno, seu cultivo e sistema de distribuição não necessitam dos conhecimentos e das facilidades que a tecnologia oferece. Pelo contrário, uma conseqüência da produção do ópio é o esaurimento do solo até sua completa infertilidade. Em janeiro, fazem o desmatamento da floresta; entre novembro e dezembro, colhe-se o arroz e entre fevereiro e março do ano seguinte, a papoula do ópio. A cultura é relativamente fácil, os instrumentos agrícolas podem ser comprados no local, mas é necessária muita mão-de-obra, geralmente suprida pelas famílias ou, numa alternativa comum, por viciados, dispostos a trabalhar na condição de marginalizados e em troca de um pouco de droga.
Economia clandestina, mas rentável
A economia do ópio atinge cifras consideráveis de fazer inveja a muitos países. Noventa por cento da produção mundial de 1996, por exemplo, foram provenientes de apenas 6 países - Irã, Paquistão, Afeganistão, Mianmá, Laos e Tailândia - e somaram 5 mil toneladas!
Colhida a delicada flor, que cresce melhor em terrenos localizados entre 1000 e 1600 metros de altitude, procede-se a duas operações: a incisão das cápsulas das papoulas e a raspagem do látex coagulado. Com uma faca com duas ou três lâminas ligeiramente curvas e de igual comprimento (cerca de 10 cm) e amarradas por uma corda de algodão, corta-se a cápsula da flor; dessas incisões sai uma linfa esbranquiçada que, entrando em contato com o ar, rapidamente coagula, tornando-se marrom escura. É esse látex que, no dia seguinte, raspado com uma faca de metal, constitui o ópio em seu estado bruto.
Para ser transportada, a droga é envolvida em pétalas de papoula ou em papel de seda: seu peso é levíssimo, pode ser bem conservada por vários anos e nenhum outro produto agrícola custa tanto por tão pouco peso.
Da produção anual de uma família - 5 a 8 quilos -, uma pequena parte pode ser para seu próprio uso, empregada para aliviar o cansaço, combater a dor, inclusive no caso de malária. A dependência da droga não traz complicações legais, mas cabe às mulheres, sobretudo as mais jovens, a maior oposição, visto que não querem se casar com dependentes de um vício que prejudica não só a saúde, mas também a imagem diante da comunidade tribal.
As capitais asiáticas da droga
TAILÂNDIA: único país do Triângulo do Ouro que conseguiu reduzir consideravelmente a produção de ópio, baixando de uma média anual de 450 toneladas, na primeira metade dos anos 70, para 40 toneladas em 1990. Logo após a proibição do uso de ópio na Tailândia, em 1959, houve uma rápida difusão do consumo de heroína. A maior parte dos usuários, que são cerca de 500 mil, dos quais 300 mil residentes na área de Bangcoc, tem menos de 30 anos.
MIANMÁ: maior produtor mundial de ópio ilegal e exportador de heroína. Ainda que seja difícil precisar as cifras reais, fala-se numa produção anual de 2300 toneladas, o que corresponde a 60% do total mundial. A maior parte da colheita de ópio é controlada por grupos das minorias étnicas.
LAOS: terceiro produtor mundial de ópio, depois de Mianmá e da Índia. O aumento do cultivo de ópio nesse país deve-se ao sucesso do programa de extirpação e substituição de suas plantações na Tailândia. Em 1990, a produção foi de 300 toneladas.
http://www.youtube.com/watch?v=SuxXwG6747I
http://mundoestranho.abril.com.br/historia/pergunta_287860.shtml
http://www.pime.org.br/mundoemissao/drogaslaos.htm
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